sexta-feira, 3 de abril de 2015

Sobre Matheus e Eduardos e Lucas, Joãos, Marcelos, Pedros e Joaquins e todos os outros...

Impossível não lembrar de Foucault quando fala que discursos não são palavras, são práticas. Silêncios e interditos podem comunicar mais do que longas enunciações,principalmente quando a comunicação se pretende social...É por isso que é preciso observar as mídias,sempre,porque são feitas por seres humanos e seus interesses,quase sempre escusos.... São feitas por escolhas.... Notícias passam por critérios de noticiabilidade que têm como regra o mercado e seguem em frente, impávidas. Seres humanos precisam parar, sentir e pensar..Notícias sempre serão notícias, palavras organizadas segundo critérios técnicos com um objetivo final..Crianças são sempre crianças...Nunca serão responsáveis pelos seus atos,mesmo que a prática cotidiana insista em colocar-lhes o peso da vida adulta,sexualizando-as em demasia, formatando-as em gêneros,cores, classes sociais e culpabilidades...Crianças que portam armas e realizam roubos, ainda assim são crianças, feitas para serem protegidas pelo Estado e pela sociedade e não atravessadas por tiros de fuzil ou encarceradas.Não,eu não falo de Eduardos e Matheus, dois meninos de 10 e 8 anos covardemente mortos na frente de casa, pela PM.Matheus, morto na Maré em 2008 com uma moeda de um real nas mãos, com a qual compraria um pão.Eduardo, morto entre a sala de casa e a rua,no Complexo do Alemão em 2015, sob os apavorados olhos da mãe. Suas mortes são inexplicáveis.. Mas as demais também o são. Crianças não podem ser confundidas com bandidos, seja qual for o grau de seu delito (se é que existe),não podem ser trancafiadas em um sistema carcerário medieval, criado para retirar dos olhos da sociedade o que não querem ver.Crianças não se tornam adultas ao habitarem comunidades, portarem armas ou cometerem crimes. Crianças continuam não sendo responsáveis pelos seus atos. A responsabilidade é nossa. Sempre.Meninos foram feitos para crescerem sob os olhos de suas mães e não terem os corpos perfurados e despedaçados por "agentes da lei" ou encerrados entre grades. Não há justificativa possível para isso... Não há ordem, stress, ideologia ou lapso que justifique a um adulto estraçalhar ou encarcerar corpos infantis sob a justificativa de proteger a ordem social.. Não há desculpas. Depois de tais atrocidades é preciso enterrar seus corpos, mas fazer suas mortes sempre presentes, em nossas práticas e reflexões. Mais do que mídia, somos humanos.temos filhos,sobrinhos,parentes,amigos..Olhem para seus meninos, esses mesmos próximos a vocês.. Pensem em todo o amor que têm por eles. Pensem no calor de seus corpos, no abraço apertado que costumam dar naqueles que amam, no sorriso que ainda guardam,mesmo nas piores situações em que possam viver...Pensem nos sonhos que costumam ter e toda a energia de seus corpos se movendo pela casa...Agora por apenas um segundo pensem na possibilidade de algo feri-los ou machucá-los sem que nada possa ser feito...Reflitam um momento.Multipliquem a dor do imaginado pela realidade que atravessa o cotidiano de tantas pessoas,todas feitas do mesmíssimo material sensível e permeados de lembranças,cotidiano e afeto que nós, que estamos aqui confortavelmente refletindo sobre suas dores.Agora a pergunta:mereciam morrer?A resposta fica a cargo de cada um...